Metodologia de remoções de extrema-direita no YouTube no Brasil

Guilherme Felitti - programador e proprietário do estúdio de análise de dados Novelo Data, especializado em analisar comunidades digitais brasileiras sobre tendências e movimentos

Data da publicação: 

Outubro 2021

Ao analisarem o discurso político pela Internet no Brasil, a academia e o jornalismo tendem a focar em algumas comunidades digitais: o Facebook, o Twitter e aplicativos de mensagens, como WhatsApp. Cada uma delas tem razões que justificam o foco. Ainda que aparentemente já tenha passado pelo seu ápice, o Facebook continua a ser a maior rede social de uso geral no mundo e, consequentemente, no Brasil. Ainda que menor, o Twitter ganhou nova relevância no país após a eleição de Jair Bolsonaro ao Palácio do Planalto. Tal qual Donald Trump, o presidente brasileiro costuma usar sua conta como uma espécie de Diário Oficial informal, com promessas de decretos, instruções a sua base de apoio e ataques a rivais. Aplicativo mais popular do Brasil, com presença estimada em 99% dos smartphones brasileiros, o WhatsApp virou uma espécie de meio de comunicação obrigatório entre familiares, colegas de trabalho e clientes.

Por mais que sejam importantes, cada uma à sua maneira, as três plataformas não são as únicas gigantescas dentro do ecossistema digital do Brasil. Em 2018, quando a Novelo Data foi formada, notamos que havia uma lacuna considerável nas análises sobre como e o que o brasileiro consumia em conteúdo digital: essa lacuna era o YouTube.

Dizer que o YouTube é o maior serviço de vídeos do planeta é um eufemismo -- de tão dominante, ele é quase o único serviço de vídeos do planeta. Seus rivais, alguns criados na mesma época em que Chad Hurley, Steve Chen e Jawed Karim colocaram o YouTube no ar em fevereiro de 2005, não conseguiram acompanhar o crescimento explosivo da plataforma, principalmente após a compra pelo Google em 2006 por US$ 1,65 bilhão. Olhando pelo retrovisor, o preço hoje parece uma piada.

Pode-se argumentar que o Facebook e o Twitter atraem perfis demográficos específicos -- o Facebook continua a ser um terreno fértil para quem defende posições políticas alinhadas à direita, enquanto o Twitter é mais relevante do que popular (o número de brasileiros que têm conta no serviço ainda é relativamente baixo se comparado a sua capacidade de propagar notícias). O YouTube não. A plataforma de vídeos compartilha com o WhatsApp uma condição mais democrática: praticamente todo brasileiro conectado à Internet usa o primeiro para ver vídeos e tem o segundo instalado para conversar. Logo, é importante entender como o discurso político no Brasil é organizado no ambiente dinâmico do YouTube.

Com isso em mente, a Novelo Data começou a monitorar o YouTube no fim do primeiro semestre de 2018. A primeira área do YouTube que a Novelo acompanhou para analisar foi o Em Alta, classificação atualizada a cada 15 minutos com os novos vídeos que mais têm atraído visualizações e interação dos usuários. O Em Alta é feito automaticamente pelo YouTube. Ao tabular mais de 17 mil classificações do Em Alta durante o segundo semestre de 2018, incluindo a eleição majoritária que levou Bolsonaro à presidência, foi possível entender como o então candidato dominou o YouTube durante a época eleitoral. Nenhum outro candidato, partido ou movimento político aproximou-se da popularidade de Bolsonaro. Na análise feita pela Novelo com os dados já tabulados, o único político que registrou dias com mais menções que Bolsonaro foi seu adversário político Luiz Inácio Lula da Silva. Não que menção significasse apoio -- ao transformar em gráfico as menções diárias a cada um deles no segundo semestre, percebe-se que Lula só ficava à frente em dias em que seu caso era julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com canais bolsonaristas citando o ex-presidente para ataques ou deboches. Bolsonaro teve dois picos de popularidade no YouTube Brasil durante o período: por ocasião da repercussão da facada recebida pelo então candidato em Juiz de Fora, no dia 6 de setembro, e no dia da confirmação da sua eleição como presidente do Brasil, em 28 de outubro.

A partir de 2019, a Novelo Data passou a seguir nichos específicos dentro do YouTube, principalmente os que agregavam canais de extrema-direita, de apoio a Bolsonaro, e canais de centro-esquerda, que faziam oposição ao governo. O monitoramento consistia em robôs que, diariamente, tabulavam informações como número de vídeos, visualizações acumuladas e número de assinantes de mais de 300 canais da extrema-direita, do centro e da esquerda. No primeiro semestre de 2020, o monitoramento detectou que canais de extrema-direita, principais investigados no inquérito de notícias falsas do STF, tinham apagado centenas de vídeos, principalmente os que atacavam as cortes. A limpeza concentrou-se em canais que foram alvo de operação realizada pela Polícia Federal como consequência do inquérito do STF, como o Terça Livre e O Giro de Notícias.

A análise sobre a limpeza viralizou no Twitter e acabou replicada por alguns dos maiores veículos da mídia, como Jornal Nacional, O Estado de São Paulo, G1, BBC Brasil e UOL. Ali, pela primeira vez, youtubers bolsonaristas tiveram a primeira evidência de que o que se falava no YouTube tinha peso legal para a Justiça. A veiculação da análise desencadeou, por sua vez, um novo processo de limpeza, que fez com que outros canais de extrema-direita escondessem vídeos de teor golpista, principalmente os que atacavam o STF e ameaçavam o Congresso. Pelo menos um canal, o Gigante Patriota, deletou todos seus vídeos e mudou seu foco ii (“pivotou”) -- em vez de eleição, o assunto principal passou a ser carros esportivos.

Até ali, o monitoramento indicava limpezas nos canais, mas não era capaz de trazer os metadados sobre os vídeos sumidos. A Novelo trabalhou para criar um novo robô, mais sofisticado, que permitisse o monitoramento diário dos vídeos que tinham sido apagados pela extrema-direita. Esse monitoramento mais profundo deu à Novelo Data a capacidade de entender melhor como os canais bolsonaristas se comportam em alguns critérios.

Os dados só indicam a existência desses movimentos -- entendê-los exige ir atrás do contexto no qual Bolsonaro e seus apoiadores estão inseridos. Com a mistura entre dados e análises artesanais, é possível entender como o bolsonarismo usa o YouTube como uma espécie de repositório onde vídeos defendendo as teorias amalucadas são publicadas sem alarde para que sejam consumidas e recirculadas em grupos do Facebook ou grupos de mensagens no WhatsApp e no Telegram. Os resultados da observação e análise da Novelo Data corroboram algo que os pesquisadores Anthony Burton, da Universidade Simon Fraser, no Canadá, e Dmitri Koehorst, da Universidade de Amsterdã, descobriram em artigo publicado na Misinformation Review, da Harvard Kennedy School. Segundo a dupla, o YouTube funciona como repositório para conteúdo que é distribuído em diversas comunidades baseadas em texto -- mensageiros, principalmente.

No Brasil, a pesquisa da Novelo Data descobriu que vídeos com conteúdo sensível ou polêmico demais são classificados como não-listados, modo de publicação do YouTube que permite acesso ao vídeo apenas por quem tem o link. Se você entrar no canal, ele não aparece na lista de vídeos disponíveis. Por exemplo, quando o senador Major Olímpio (PSL) morreu de COVID-19 em 18 de março de 2021, a youtuber Leda Nagle no mesmo dia classificou a entrevista que tinha feito com ele como não-listada. Só consegue vê-lo quem tem o link. O vídeoiii está assim até hoje. Não está clara qual foi a motivação de Nagle de tornar o vídeo não-listado.

A análise diária desses vídeos junto à contextualização política permite classificar as centenas de canais em alguns grupos, levando em conta critérios específicos para tanto. O primeiro deles engloba os que realizam remoções frequentes. O maior exemplo disso é o canal Foco do Brasil, criado em 9 de maio de 2014 com o nome de Folha do Brasil. O Foco do Brasil é uma espécie de canal extra-oficial de Bolsonaro. Sempre que o presidente fala com seus apoiadores na saída do Palácio da Alvorada, é para a câmera do Foco do Brasil que ele fala. Não à toa, sempre que frases polêmicas de Bolsonaro no Alvorada são publicadas, o primeiro canal que as veicula é o Foco do Brasil.

Um bom exemplo do papel que o Foco do Brasil tem como divulgador de mensagens vindas diretamente do próprio Bolsonaro aconteceu em 14 de abril de 2021. De manhã, o presidente falou com apoiadores na saída do Palácio do Alvorada que prevê uma “crise enorme”iv iminente e pediu “uma sinalização” do povo para que possa “agir”. No bolsonarismo, o verbo “agir” é um dog whistle para golpe de estado -- em todas as vezes que a Novelo Data encontrou bolsonaristas referindo-se à “ação” do presidente, notava-se um contexto explícito de ataques a órgãos basilares da democracia, como o Legislativo (na figura do Congresso Nacional) e o Judiciário (representado principalmente pelo Supremo Tribunal Federal). O primeiro canal no YouTube a publicar a fala do presidente foi o Foco do Brasil, às 9h35,v horário de Brasília, no vídeo com título “Bolsonaro diz que o Brasil está no limite, teme enorme crise e diz aguardar sinalização para agir"vi. Minutos depois, o link para o vídeo começou a viralizar em grupos de mensagem bolsonaristas acompanhados pela Novelo Data. Às 9h42, o vídeo apareceu pela primeira vez no canal do Telegram Bolsonaro Presidente, com então mais de 10 mil seguidores. Nas horas seguintes, o mesmo link foi republicado neste e em outros grupos bolsonaristas.

Da mesma forma que publica muito, o Foco do Brasil também apaga muito. Quando colocamos em um gráfico o número de vídeos disponíveis para visualização no Foco do Brasil, nota-se como a curva sobe e desce pelos últimos dois anos. Há limpezas frequentes do conteúdo, o que levanta a suspeita de que o canal funcione, em muitos casos, apenas como um ponto de partida para o espalhamento de conteúdo. O conteúdo do vídeo, ainda que não esteja mais online em seu ponto de partida, continua a estar disponível para viralizar em grupos bolsonaristas ao ser replicado por outros canais ou até mesmo como arquivo enviado diretamente nos grupos.

>Outros canais que se encaixam nessa categoria são o Vlog do Lisboa, de Fernando Lisboa,Riccardo Ribeiro, DR News, Emerson Teixeira e Papo Conservador com Gustavo Gayer.

O segundo grupo é o dos que fazem remoções muito pontuais, motivadas por movimentações jurídicas, principalmente investigações promovidas por órgãos públicos, ou risco de perder reputação frente ao seu eleitorado. Esses tratam as remoções como formas de tentar apagar rastros específicos, discursos que possam prejudicá-los frente à lei ou ao seu eleitorado. É uma estratégia comum no bolsonarismo dados os frequentes rompimentos entre aliados, que se transformam em inimigos políticos.

Comecemos por quem apaga vídeos por medo das consequências legais. De novo, um bom exemplo é o Terça Livre TV. Após ser alvo da operação de busca e apreensão da Polícia Federal em maio de 2020, o canal escondeu 272 vídeos. Não foi o único: O Giro de Notícias, comandado por Alberto Silva, escondeu 148 vídeos após ser alvo da mesma operação. Não foi a única vez que ambos os canais esconderam conteúdos em razão da proximidade da lei. Em dezembro de 2020, ambos esconderam, juntos, 138 vídeos após um segundo inquérito do STF, desta vez sobre a organização de atos antidemocráticos. Foi em dezembro que o relatório do inquérito foi finalizado. A investigação mostrou o envolvimento do Terça Livre, O Giro de Notícias e outros canais com um sistema gerenciado a partir do Palácio do Planalto para divulgar informações em troca de estratégias de monetização que podem render até R$100 mil por mês. O jornal O Estado de São Paulo publicou a íntegra do relatóriovii.

No começo de fevereiro, o YouTube baniu o canal do Terça Livre por repetidas infrações às próprias regras -- curiosamente, há uma forte suspeita de que a punição que levou ao banimento tenha relação não com a distribuição de mentiras sobre a pandemia de COVID-19, mas com violação de direitos autoraisviii. Nove dias depois do banimento, o juiz Mathias Coltro, da 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, determinou que o YouTube reativasse o canalix.

Baseado na experiência da Novelo Data, não há uma área que faça o YouTube agir mais rápido na remoção de vídeos e canais do que direitos autorais. As ferramentas de identificação automática de som e imagem significam que vídeos com conteúdo protegido são marcados em pouco tempo pelo YouTubex. Em alguns casos, o/a dono/a do conteúdo original se torna o/a beneficiário/a dos ganhos do vídeo que tem trechos seus. Quando o/a dono/a não quer o conteúdo no ar, o YouTube alerta o youtuber da decisão e, caso o vídeo não seja excluído, a própria plataforma exclui e dá um strike(advertência) ao canal. Pelo sistema de punições do YouTube, acumular três strikes em um período de 90 dias resulta na exclusão do canal.

No levantamento da Novelo, a guerra de copyright entre Terça Livre e Regina Vilella que levou ao terceiro strike e consequente remoção do canal antes da Justiça recuperá-lo não foi a única -- houve também, por exemplo, disputas envolvendo os youtubers Gabriel Monteiro e Antonia Fontenelle em setembro de 2020 (o vídeo foi reativado)xi, os >youtubers “Luiz Viajante Bolsonaro 2022” e Flavio da Silva Guimarães em novembro de 2020xii e até o presidente da República, ao republicar sem autorização o vídeo de um canal focado em registrar trens e ferrovias em abril de 2021xiii.

Há os canais que reagem a ameaças não diretamente contra si. Limpam a base de vídeos como um cuidado extra, uma precaução frente a problemas legais alheios. Em 16 de fevereiro de 2021, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) publicou vídeos nas redes sociais atacando ministros do STF e defendendo o fechamento do tribunal. Na mesma madrugada, o deputado foi preso em flagrante por determinação do ministro Alexandre de Moraesxiv. No dia seguinte (17), por unanimidade, o plenário do STF confirmou a prisãoxv. Em 18 de fevereiro (ou seja, um dia após a confirmação da prisão), o deputado federal Paulo Martins (PSC-PR) deletou 15 vídeos do seu canalxvi. Os vídeos se concentravam em três assuntos: STF, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (ambos com abordagens críticas) e Forças Armadas. Três dos vídeos falavam, explicitamente, em intervenção militar -- "ATENÇÃO: General diz que STF pode ser indutor de violência e aí é dever das Forças Armadas intervir", por exemploxvii. Foi a primeira vez no monitoramento da Novelo Data que Paulo Martins ocultou vídeos.

O terceiro grupo é o que não remove nada. Fazem parte desse grupo membros do governo mais próximos ao presidente, incluindo o próprio, seus filhos e seus correligionários mais fiéis, como as deputadas federais Bia Kicis (PSL-DF) e Carla Zambelli (PSL-SP). Esse grupo só tem conteúdos removidos quando o próprio YouTube os desativa. Foi o que aconteceu, por exemplo, com Kicis em 5 de março de 2021, quando a plataforma apagou um vídeo em que a parlamentar entrevistava Alessandro Loiola, médico que se notabilizou como um dos maiores negacionistas da pandemia de COVID-19. Com teorias mentirosas sobre lockdown, vacinas e “tratamento precoce”, Loiola arregimentou cerca de 70 mil seguidores em seu canal no YouTube antes de ser excluído pelo YouTube em 29 de abril. Loiola compilou suas teorias delirantes em um livro chamado COVID-19: A fraudemia. No vídeo do canal de Kicis removido pelo YouTube, Loiola desfiava alguns desses delírios sobre vacinasxviii.

Entram no grupo também os Bolsonaro -- no total, 21 vídeos da família foram excluídos pelo YouTube desde o começo da pandemia. Dois foram do canal de Flávio Bolsonaro, dois foram do canal de Eduardo Bolsonaro e 17 foram do canal de Jair Bolsonaro. Nenhum deles foi removido pelos políticos -- todos foram parte de ações do YouTube. É bom esclarecer que, mesmo com esse total, os canais dos três continuam a veicular vídeos com conteúdo negacionista da pandemia que, ainda que explicitamente infrinjam as regras da plataforma, seguiam no ar em junho de 2021.

É bom esclarecer que essa metodologia de agrupamento de canais conforme a rotina de exclusão de vídeos não é rígido. É possível ver youtubers que transitam entre os canais. Após a instauração da CPI da Pandemia no Senado, a partir do dia 8 de abril de 2021, esse comportamento foi observado entre os youtubers Alexandre Garcia e Leda Nagle. Até então, ambos pertenciam ao terceiro grupo -- apoiadores ferozes do governo Bolsonaro, não havia qualquer movimentação para limpar a própria base de vídeos. A partir do fim de abril, porém, ambos passaram a promover limpezas diárias dos seus canais, o que acabou fazendo com que ambos se “mudassem” para o segundo grupo da metodologia. Em um espaço de pouco mais de 15 dias (de 30 de abril a 14 de maio), Alexandre Garcia promoveu seisremoções e Leda Nagle, sete remoções de vídeos dos seus canais. No total, ele escondeu (apagou ou tornou privados) 549 vídeos (o que equivalia a quase metade de todos os conteúdos do canal) e ela escondeu 184 vídeos. Vale frisar que apenas um vídeo de cada canal foi apagado pelo YouTube.

As limpezas de Garcia e Nagle são consequências diretas das novas regras para combater desinformação sobre “tratamento precoce” no YouTube, anunciada dois dias após o plenário do STF confirmar a decisão do ministro Luís Roberto Barroso de instaurar a CPI da pandemia -- Barroso deu a ordem no dia 8 de abrilxix, o plenário confirmou no dia 14xx e o YouTube Brasil anunciou as regras no dia 16xxi. Nos casos dos dois youtubers, o monitoramento da Novelo Data identificou a mesma dinâmica: as limpezas promovidas por Garcia e Nagle começaram após o YouTube remover um vídeo por infração às regras. O YouTube Brasil não confirma oficialmente o que fez. Os youtubers alegam que os vídeos foram marcados.

A teoria encontra ressonância na experiência da Novelo ao monitorar a extrema-direita no YouTube. Com as informações disponíveis, nossa teoria é que o YouTube deu uma espécie de tiro de alerta (o que os ingleses chamam de “warning shot”) com o vídeo apagado, o que contou uma strike, e marcam um número não definido de vídeos que infringem suas regras e, por isso, seriam apagados. A plataforma supostamente deu aos youtubers a chance de remover os vídeos e preservar o canal ou deixá-los visíveis para que o próprio YouTube os removesse e, com o sistema de strikes ativas, o canal fosse excluído. Garcia e Nagle escolheram a primeira opção.

Há, porém, uma pegadinha aqui. Com as poucas informações disponíveis, não é possível dizer ao certo que o números de vídeos apagados ou tornados privados por Garcia e Nagle é idêntico ao número de vídeos marcados pelo YouTube Brasil. Há uma chance considerável de que ambos tenham aproveitado o argumento de que “o Google me obrigou” para colocarem no balaio outros vídeos desabonadores às suas reputações em um momento de investigação pela CPI, sem que o YouTube os tenha marcado como problemáticos.

Por fim, esse artigo propõe a primeira versão de uma metodologia para enquadrar canais do YouTube com discurso político baseado em suas rotinas de remoção e/ou ocultamento de vídeos como resposta aos desenvolvimentos políticos do país. A metodologia foi organizada a partir da experiência da Novelo Data em monitorar e analisar as comunidades de extrema-direita no YouTube Brasil pelos últimos três anos. Como estamos falando de um ambiente dinâmico no qual antigos players perdem e novos ganham relevância, é provável que a metodologia ainda precise de novas revisões para poder acolher de modo consistente todos os grupos.

Ainda assim, pensar em como organizar esses movimentos é importante pela relevância que o YouTube tem dentro da estratégia de comunicação política no Brasil dos últimos anos, principalmente para o bolsonarismo. O uso do YouTube como repositório em que vídeos favoráveis ao presidente são publicados para serem distribuídos e apagados assim que a mídia já “ganhou pernas” dentro de comunidades externas, como grupos de WhatsApp e Telegram, coloca a plataforma como um dos pilares desse ecossistema, o que exige análises atentas sobre como players maliciosos a usam.

As recentes revelações sobre como esses mesmos canais são beneficiados financeiramente, seja com campanhas públicas ou privadas, joga ainda mais luz sobre a motivação que youtubers bolsonaristas têm para manterem seus canais sempre atualizados. É um assunto que continuará a mostrar-se relevante conforme novas análises, como a da Novelo Data, e novas informações, apuradas pela imprensa nacional, aparecerem.

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